Hiperestesia Indireta do Pensamento - HIP

      Em primeiro lugar, os mecanismos da faculdade chamada HIP, ou Hiperestesia Indireta do Pensamento. Todos os nossos atos psíquicos, de qualquer espécie, conscientes ou inconscientes, pensamentos, recordações, sentimentos; se traduzem ou são acompanhados por reflexos físicos de diversas ordens. Por exemplo, um falar muito diminuído, muito suave, muito subterrâneo; umas emanações do tipo magnético detectadas hoje e medidas pelos russos, de uma hiperfrequência notável; uns reflexos na pele, reflexos também motores, etc.

       Através deste mecanismo, os pensamentos de qualquer pessoa passam às pessoas que estão presentes; tudo o que nós sentimos e imaginamos passa e não pode deixar de passar às pessoas que estão presentes. Essas pessoas, inconscientemente, captam de uma forma direta , os reflexos sensoriais e indiretamente os pensamentos ou os atos psíquicos que os provocaram. Este é o mecanismo da Faculdade Hiperestesia Indireta do Pensamento, a HIP, mecanismo certamente complexo, impossível de ser explicado em poucas palavras.

       Tudo o que as pessoas presentes sabem, o inconsciente também sabe. É lógico, portanto, que algumas vezes o manifeste. A HIP se revela de duas maneiras: por contato ou sem contato. Quando é por contato, chamamo-la cumberlandismo, por ser Eduardo Cumberland, o primeiro a descobrí-lo e a apresentá-lo, inclusive, em demonstrações públicas.

     Nosso inconsciente,  às vezes, pode manifestar (casos especiais ou pessoas especiais) tudo o que as pessoas presentes (a poucos metros, pois depende dos sentidos) conhecem, incluindo conhecimentos inconscientes. Nosso inconsciente é um sábio prodigioso.

Uri Geller pretende "dominar" a HIP (Nem
ele mesmo evita rir de tão cômica pretenção)

           LEITURA SENSORIAL DO PENSAMENTO -

 Mais do que o cumberlandismo, adivinhação por contato, interessa-nos especialmente a adivinhação sem contato. Pode-se, a certa distância, captar a linguagem fisiológica mínima, i. é, os reflexos externos da idéia, de modo que se possa, indiretamente, como que "ver" o pensamento de outra pessoa?

            É possível. Até mesmo para apresentações no palco. Seria isso um "cumberlandismo sem contato". E pode-se chegar a extremos maravilhosos, como o ilusionista Mario n, por exemplo.

            Mario n encontrava os objetos escondidos pelos espectadores mesmo quando a testemunha que inconscientemente o dirigia se escondia dentro de uma caixa, só aparecendo os pés.

            Mario n observava nestes casos as mínimas modificações inconscientes na marcha do espectador que se tinha prestado à experiência.

            O Dr. Samuel Soal (um dos melhores experimentadores da moderna Parapsicologia) estudou detidamente as provas realizadas por Mario n. Soal chegou à conclusão de que, não obstante as maravilhosas provas, Mario n não possuía sentidos mais desenvolvidos que o comum das pessoas (o que confirma mais uma vez que todos somos hiperestésicos no inconsciente), mas que ele tinha aperfeiçoado sua capacidade de observar com o que descobria sinais que pareceriam imperceptíveis, normalmente.  Mas esses sinais que até conscientemente se podem perceber com muito exercício de observação, o inconsciente já os tinha percebido antes.

            Quantas adivinhações tidas como telepatias, como comunicações do além, etc. não são mais do que o subir ao consciente esses sinais inconscientemente captados!

            Já Binet chamava a atenção sobre essa possibilidade e aduzia muitos casos confirmativos.

            Fizeram-se famosas as experiências do Dr. Laurent.

            Repetindo as do Dr. Pickmann, o Dr. Laurent "pode executar, à distância de quatro metros mais ou menos, as ordens dadas mentalmente por certas pessoas, ordens muito simples, evidentemente, tais como a escolha de um objeto sobre a mesa".

            Este tipo de experiência tornou-se clássico entre os hipnotizadores. O divulgador Paul Clément Jagot, por exemplo, ensina o modo de treinar os sujeitos para chegarem a realizar estas experiências, inclusive fora da hipnose, em vigília.

            Isto não é telepatia, mas o que chamamos HIP = Hiperestesia Indireta do Pensamento. O "transmissor", ao procurar transmitir ao receptor o que deve realizar, não pode evitar que seu pensamento se reflita em sinais inconscientes. Estes, e não diretamente a ordem mental, são os captados.

            O próprio Dr. Laurent acrescenta:

            "Bem analisando o fenômeno em mim mesmo, tenho constatado que se tratava de hiperacusia (hiperestesia auditiva) em mim, ou percepção de ordens como que pronunciadas inconscientemente: à direita, à esquerda, sim, não".

            Esta hiperestesia dos sinais dados inconscientemente pelo "transmissor" exagera-se às vezes, tanto quanto vimos se exagerava em certos hipnotizados.

            O Dr. Grasset transcreve a carta que lhe escreveu o Pe. D'Aix:

           "Encontro sempre com a maior facilidade o objeto que me escondem. Com os olhos vendados, sem ver (...) Dirige-me por detrás de mim o Sr. M. (...), concentrando-se fortemente no pensamento que me quer fazer executar (...) Sinto, positivamente sinto, uma pressão sobre as costas, na parte direita superior quando me quer fazer dar a volta (...) É uma pressão doce, algo de sopro e de ímã, que se exerce, não diretamente sobre meu cérebro, mas sobre minhas costas (...) Eu estou sempre a  menos de dois metros dele".

            Na mesma carta o Pe. D'Aix descreve mais claramente "o exagero", a ampliação automática do mínimo estímulo, quando acrescenta:

          "As vezes, quando o senhor M... quer que eu me incline, sinto na cintura um peso extraordinário (...), dir-se-ia que suporto um peso de 50 quilos".

            CONDENADO POR HIPERESTÉSICO - Um caso interessantíssimo é o de Ludwig Kahn:

           Havia sido condenado pelo tribunal de Karlsrube, acusado de atribuir-se dolosamente um Dom de "lucidez". Ludwicg Kahn para reabilitar-se, recorreu ao Dr. Schottelius pedindo que o submetesse a quantas provas e as mais rigorosas que quisesse para comprovar a veracidade do seu Dom de "leitor do pensamento".

            Schottelius colocou Kahn no vestíbulo e ele próprio fechou-se no seu gabinete. Escreveu diferentes frases em três papéis. Depois os dobrou "em oito" e apertou um dos papéis na mão direita bem fechada, outro papel na esquerda e o terceiro deixou-o bem à vista diante de si sobre a mesa.

            Mandou então que trouxesse Kahn. E este, a metro e meio do professor, levantou os olhos ao teto e logo disse as frases que estavam escritas nos papéis.

            Outras experiências semelhantes foram realizadas pelo Dr. Schottelius, assim como já antes as tinham realizado outros doutores eminentes chegando, como ele, à conclusão de que o fenômeno de "visão sem a ajuda dos olhos corporais" (em frase de Schottelius) é incontestável... Algumas vezes!

            Além dos médicos, também os parapsicólogos observaram Kahn em condições rigorosas de experimentação. Depois de umas experiências de orientação, de sondagem, que começaram em Paris em 1925 no Instituto Metapsíquico Internacional (IMI), prestigiadíssimo até hoje, realizaram experiências tanto mais rigorosas quanto mais assombrosos pareciam aos investigadores os êxitos de Kahn.  Mas ao fim tiveram que reconhecer "que estamos perante um fenômeno limpo e irrefutável", segundo a expressão do diretor do Instituto, um dos melhores parapsicólogos da história, Dr. Eugêne Osty.

            Mas as experiências do Instituto Metapsíquico Internacional terminaram de chofre porque de novo em 1931, um tribunal de Paris condenou Kahn como falsário. O tribunal não podia admitir tal capacidade humana de conhecimento...

            Não queremos dizer com isto que Kahn nunca fraudasse. Quem nunca frauda não é psíquico. Não é sensitivo quem domina seu inconsciente até tal ponto que não se veja impelido a fraudar, ao menos inconscientemente, quando o fenômeno que se espera não sai autêntico. O que afirmamos é que muitas das experiências realizadas por ele foram muito bem conduzidas para evitar toda a fraude. O fenômeno em muitas ocasiões é incontestável para qualquer pessoa que conheça as experiências realizadas.

            Em todas essas experiências e outras que se poderiam citar, trata-se evidentemente de percepção hiperestésica dos sinais inconscientes emitidos pelo pensante: diríamos cumberlandismo, mas sem contato. Algumas pessoas facilmente podem pensar que se trate de telepatia, como pensara Schottelius e muitos que observaram Kahn, sem refletirem, entre outros vários detalhes, em que era necessária  a presença do experimentador que tinha escrito a frase ou feito o desenho. Com a ausência dele, nada sucedia. O fenômeno era, pois, sensorial; era o que chamamos Hiperestesia Indireta do Pensamento (HIP).

            CRIANÇAS PRODIGIOSAS - Os casos que vamos citar talvez não sejam mais importantes que outros. Mas os casos que citamos têm a vantagem de terem sido muito bem investigados. Aliás, por tratar-se de crianças ingênuas, atrasadas mentais,  prestam-se menos a uma explicação por fraude...

            Muito conhecida se fez a menina Ilga K. de Trapene (Letônia). De pais sadios teve um desenvolvimento físico normal, mas intelectualmente ficou muito retardada. Aos oito anos tinha o linguajar de uma criança de dois. Nunca conseguiu aprender a ler nem calcular. Não passou do conhecimento isolado das letras e dos algarismos. Pois bem, aos nove anos, apesar de ser incapaz de ler e calcular, quando se concentrava, Ilga lia qualquer parágrafo em qualquer língua incluindo Latim e Grego antigo; resolvia problemas matemáticos, contanto que alguém (principalmente sua mãe) os tivesse em sua presença, lendo mentalmente o mesmo paragrafo ou pensando na solução do problema. Discutia com professores universitários sobre qualquer tema: "sabia" (sem compreender nada) ; tanta matemática quanto os professores de ciencias exatas; discutia com os catedráticos de medicina...(captava por HIP, a resposta dos próprios pesquisadores). Numa ocasião, em vez de 42 Ilga disse 12, mas se perguntou à mãe e comprovou-se que a mãe tinha confundido o número 4 com o 1, pela maneira como estava escrito.

            A menina não "lia" o papel mas apenas sentia o que a mãe lia. Um médico do lugar, o radiologista Dr. Kleinberger, comprovou o caso e avisou ao Dr. Neureiter, professor de Medicina Legal na Universidade de Riga. Ilga foi examinada também por especialistas como os Drs. Rochacker e Menshing (de Bonn), Dubicshff (de Berlim), etc. 

        Investigações sucessivas, rigorosas, continuadas; de especialistas de vários países demonstraram que se tratava de um caso de manifestação de HIP-Hiperestesia Indireta do Pensamento-  

            Segundo as atas das experiências, alguma vez se realizaram estas estando a mãe e a filha separadas por uma porta fechada. Mesmo com a porta fechada, é possível a hiperestesia em bons sensitivos. A porta fechada não pode impedir que, pelos interstícios, cheguem ao sensitivo certos sinais como os sons emitidos pelas cordas vocais, o movimento do ar, os reflexos de luz, etc.

            Após as experiências de Neureiter e a publicação do seu livro a respeito, foi nomeada pelo Ministério de Instrução Pública uma primeira comissão sob a presidência do Dr. Dale, diretor do Laboratório de Psicologia Experimental da Universidade de Riga, comissão que incluía psiquiatras, psicólogos, físicos, especialistas em Fonética, em Pedagogia para surdos-mudos, etc.

            Além disso, a menina ficou durante 11 meses sob a observação  de uma especialista em Psicologia e Pedagogia. Os resultados das investigações da comissão foram publicados pelo Dr. Hans Bender do laboratório de Parapsicologia da Universidade de Friburgo.

            A conclusão da comissão parece-nos acertadíssima: "não se trata de telepatia, a não ser de maneira episódica". Trata-se de Hiperestesia Indireta do Pensamento, especialmente de natureza auditiva: Ilga percebia os "cochichos involuntários" da mãe, para expressar-me pelos mesmos termos dos investigadores; "cochichos" que passavam imperceptíveis às testemunhas, por não serem sensitivas.

            Por ser hiperestesia preferentemente auditiva, se explica que pudesse captar o que lia ou pensava a mãe, apesar de esta estar detrás de um cortina ou detrás de uma porta, mas não percebia nada se a mãe ficava dentro do estrito isolamento da sala de transmissão da emissora radiofônica de Riga, apesar de que Ilga via a mãe através dos vidros. Nesta ocasião, a menina (retardada mental) gritou à mãe: "não ouço nada!".

            "Os lábios da mulher... moviam-se simultaneamente com as expressões da menina", mas ninguém, exceto a sensitiva Ilga, podia ouvir nada absolutamente, além de que às vezes, como expressamente se diz nas atas, a menina dizia a palavra antes de que os lábios da mãe se mexessem. A comissão, aliás, fez que durante algumas experiências se gravassem em discos os sons ao mesmo tempo em que máquinas cinematográficas iam filmando todos os movimentos, comprovando desta maneira que nem sempre houve movimento dos lábios da mãe, antes nem ao tempo da menina dizer o que a mãe pensava. Nestas ocasiões, como comprovou uma Segunda Comissão de especialistas lituanos, o "cochicho" da mãe era interno, nas cordas vocais e demais "órgãos motrizes da linguagem" internos.

            Uma outra anotação interessa-nos nesse caso. É que, como já noutra ocasião temos indicado, os sensitivos o são porque podem manifestar no consciente o que todos captamos só inconscientemente. Referindo-nos ao caso concreto da menina Ilga, a sua audição consciente era absolutamente normal, como demonstraram vários testes auditivos.

            As Academias de Medicina de Paris e Angers estudaram o caso de Ludovico, caso idêntico ao de Ilga. Muitas revistas de Medicina e Psicologia, dentro e fora da França, ocuparam-se do caso. O Dr. Fargues publicou um relatório interessantíssimo a esse respeito.

            Esta qualidade, porém, punha Ludovico em circunstâncias difíceis para a vida. Quando sua mãe procurou ensiná-lo a ler, compreendeu que era impossível. "Adivinhando", o menino não exercitava nem o juízo nem a memória. Alarmada a família teve de separar Ludovico da mãe para que pudesse receber uma educação normal. Na ausência da mãe o menino deixou de destacar-se como "adivinho".

            Se fosse telepatia, como afirma a maioria sem profundos conhecimentos de Parapsicologia, o fenômeno se produziria exatamente igual na ausência da mãe, pois no conceito de telepatia se inclui que o fenômeno prescinde da distância. É a hiperestesia a que requer, evidentemente, a presença do "transmissor". Aliás, a telepatia não se pode provocar à vontade, menos ainda com a pasmosa regularidade com que Ludovico captava as idéias da mãe.

            Também se fez muito famosos o menino Bo, de onze anos, retardado mental. A mãe, precisamente pelo pouco proveito que o menino tirava na escola, dava-lhe aulas em casa. E descobriu que Bo dizia espontaneamente para ela palavras, números, coisas que ela só tinha pensado. Bo, que era incapaz de desenhar um quadro ou de repetir uma das frases que no teste de Binet se marcam para menores de cinco anos,  era capaz, porém, de resolver qualquer problema, dar qualquer resposta, por difícil que ela fosse, se a solução era conhecida pela mãe.

            O Dr. Drake, do Wesleyan College, de Georgia, estudou o caso e fez experiências com o menino. Mais uma vez, não se tratava de telepatia, como pensou o Dr. Drake. A telepatia, extra-sensorial, não precisa da presença do agente. Dizem expressamente as atas:

           "Era capaz de dar respostas maravilhosas sempre que estas estivessem na mente da mãe, mas não podia fazer absolutamente nada se ela o deixava sozinho" ou "o menino não pode ler se alguém não está sentado perto dele olhando o livro. Então lê bem, mas, se o deixam sozinho não pode".

            Captam-se, pois, sinais sensoriais. É um caso de Hiperestesia Indireta do Pensamento, HIP.

            Acerta, pois, plenamente quem foi meu professor, Fernando Maria Palmés, S.J., quando, referindo-se precisamente ao caso do menino Ludovico, escreve: "Os fatos aduzidos se diferenciam do Cumberlandismo propriamente tal, em que (...) falta o contato muscular. As impressões correspondentes aos fenômenos mentais transmitidos, seriam sinais acústicos ou visuais. Pode-se também recorrer à percepção tátil das distintas emissões de ar produzidas inconscientemente pelos órgãos fonéticos do transmissor (...) Tudo isto parece a explicação mais lógica nos casos em que o receptor está a curta distância do transmissor".

            A regularidade com que o menino Ludovico, ou Bo, ou Ilga captavam o pensamento da mãe e a quase absoluta ausência de adivinhações com respeito a outras pessoas, explica-se muito bem por poucas noções que se tenham de Reflexologia. Os meninos, por afetividade, ou treino natural, tinham-se condicionado aos sinais reflexos característicos dentro da individualidade da mãe. Ora, o inconsciente tem, ou pode alcançar, uma grande delicadeza para diferenciar os diversos estímulos. Pavlov conseguiu condicionar uns cachorros para um "sinal condicionado" de 250 vibrações. Os sons imediatamente superiores e inferiores, não constituíam sinal para os reflexos condicionados, apesar de parecerem ao nosso consciente absolutamente indiferenciáveis.

           A assombrosa capacidade de diferenciação de estímulos ou sinais condicionados de que o inconsciente é capaz é, por si mesma, uma grande hiperestesia, como já mostramos nos dois artigos anteriores.

            Outros sensitivos, porém, não se condicionam tão especificamente às características individuais, mas apenas captam os sinais comuns de toda a espécie humana ou de quase todos os homens, não só os de uma única pessoa. Os cachorros de Pavlov, em geral eram condicionados mediante luzes ou qualquer som de apito ou de campainha sem que distinguissem os diversos matizes do som ou voltagem da luz.

           

O MECANISMO DE CAPTAÇÃO DE SINAIS - Sabe-se que há certas emissões de sinais correspondentes aos atos

Desenho com o qual o Dr. Calligois (professor de neurologia
em Universidade de Roma) explica a HIP: "falamos" com todo
o corpo e o inconsciente das pessoas presentes "entende".

 internos, embora seja difícil determinar em cada caso quantos e de que tipo são os reflexos fisiológicos externos, os sinais emitidos.

            Sabe-se também que o homem capta esses mínimos sinais ou reflexos fisiológicos externos correspondentes ao pensamento de outra pessoa presente, pois o homem é hiperestésico ao menos no inconsciente.

            A HIP é a captação e interpretação, geralmente inconsciente, desses sinais. Nos sensitivos essa interpretação passa ao consciente sem que, geralmente, saiba donde veio essa adivinhação, pelo que freqüentemente o fenômeno foi  interpretado supersticiosamente.

           O Dr. Calligaris, professor de Neurologia na Universidade de Roma, em  numerosas passagens de um dos seus livros, afirma, após numerosas experiências, que o "reflexo fisiológico das idéias passa às pessoas presentes como por ressonância ou consonância". A idéia, sentimento, etc., não só tem repercussão fisiológica em determinadas e mínimas "áreas" ou "campos" cutâneos dessa mesma pessoa, senão que a mesma repercussão experimentam por ressonância as "áreas" ou "campos" correspondentes das pessoas presentes.

            Com certas técnicas pode-se aumentar essa repercussão fisiológica

           Essa ressonância ou repercussão seria em definitivo o que nós chamamos hiperestesia, percepção inconsciente dos sinais. Uma hiperestesia cutânea, acrescentando-se à hiperestesia visual, auditiva... Por muitos caminhos o reflexo fisiológico do pensamento de outra pessoa passa a nós ou às pessoas presentes.          

             E como tais reflexos se identificam com o pensamento, como pensamento e reflexo são apenas dois aspectos diferentes de um só fenômeno, compreender-se-á que, se inconscientemente são reproduzidos em nós esses reflexos fisiológicos de outra pessoa, também teremos captado inconscientemente o pensamento.

            Se com técnicas especiais, ou pelo treino espontâneo ou provocado, ou em circunstâncias especiais esta ressonância é aumentada em certas pessoas, compreender-se-á que, nessas pessoas, o que só era adivinhação inconsciente possa fazer-se consciente. Nos sensitivos este exagero, esta passagem do inconsciente ao consciente, é mais freqüente ou até quase regular.

 

A IMPORTÂNCIA DA HIP

A famosa sensitiva de Roma, Sandra
Bajetto "enganou" muitos "sábios".
Várias vezes em contato com objetos
adivinhava coisas referentes aos
donos dos mesmos. Deduziram que
captava impregnações? Puro engano.
Os presentes sabiam do que se
tratava...: HIP.

FREQÜÊNCIA - Em primeiro lugar deve-se destacar que HIP é muito mais freqüente que a telepatia ou qualquer outro fenômeno paranormal, extra-sensorial. Já Puységur, um dos primeiros investigadores do hipnotismo, advertia os hipnotizadores contra o erro de considerar como telepatia muitos atos que não o são, tanto que chegou Puységur a afirmar expressamente que "era erro pensar que, por meio de um sonâmbulo (hipnotizado) clarividente se pudesse adivinhar o pensamento de uma pessoa ausente, pois o único que se obtinha em tais ocasiões era inspirado inconscientemente pelo próprio observador".

Uma experiência fácil, inspirada no livro do parapsicólogo Pe. Júlio Maria ("Os segredos do Espiritismo"). Com excelentes reflexões contra o Espiritismo, a experiência tem comprovado inúmeras vezes que HIP é mais fácil e freqüente que a telepatia. Os leitores podem repetir a experiência com facilidade.

Se a um adivinho, médium, radiestesista etc., se apresenta uma série de envelopes, não é impossível que alguma vez o adivinho seja capaz de dizer o conteúdo de algum desses envelopes. Mas se não fomos nós mesmos que escrevemos as frases dos envelopes, mas um amigo que no-las enviou por correio (e isto é mais seguro do que a entrega pessoal para se evitar toda a hiperestesia inconsciente em nós), comprovaremos que só rarissimamente, em proporção enormemente menor e só muito bom adivinho será capaz de dizer-nos o conteúdo do envelope.

Esta experiência, ou semelhantes, provam perfeitamente que no primeiro caso, i. é, quando a consulta é feita pela própria pessoa que escreveu, é mais fácil acertar, por tratar-se de Hiperestesia Indireta do Pensamento. Mas no segundo caso onde não pode haver sinais inconscientes, os acertos são mais difíceis e raros por tratar-se de telepatia ou conhecimento extra-sensorial.

Muitas vezes é o espectador que se trai a si mesmo, ao consultar a um adivinho, ou nas sessões mediúnicas, ou... O médium ou adivinho não sabe mais do que aquilo que o consulente lhe diz na linguagem dos sinais inconscientes e involuntários. O estado de transe do médium, ou de delírio, narcotismo, histeria em que entram natural ou artificialmente muitos adivinhos, ajuda evidentemente à hiperestesia. Por outra parte, a corrente de certas sessões espíritas favorece a hiperestesia do pensamento de tipo cumberlandismo. Cumberlandismo e HIP em geral, combinados, podem, é claro, chegar a limites insuspeitos em pessoas especialmente "dotadas" e especialmente treinadas.

E o resultado, pode ser só o de confirmar o consulente na sua idéia talvez errada. Já no seu tempo dizia Richet: "Se eu conheço a palavra Margarida que o médium deve dizer, e mormente se o médium tem dúvidas, eu lhe fornecerei, muito ingenuamente, as indicações que precisar, retificarei seus erros, serei seu cúmplice involuntário..."

E há outro perigo. O adivinho simplesmente revela os pensamentos, os temores dos consulentes. Um consulente, por exemplo, pode estar com medo infundado de estar doente do fígado. O adivinho pode confirma-lo no erro, com perigosas conseqüências.

   

A MAL CHAMADA CRIPTOSCOPIA - Criptoscopia, com propriedade de linguagem só pode tomar-se em sentido fisiológico. Criptoscopia fisiológica seria a visão verdadeira através dos corpos opacos: visão autêntica, ocular, impressão retiniana por qualquer tipo de raios luminosos, ou outros desconhecidos como queriam alguns metapsíquicos (nome dado aos antigos parapsicólogos).

Não seria criptoscopia propriamente a visão alucinatória por adivinhação.

Criptoscopia, fisiológica, para os especialistas em Parapsicologia, é só um aspecto da hiperestesia direta estudada no 1º artigo desta série. Visão retiniana através dos corpos relativamente opacos, opacos só para as pessoas normais, não verdadeiramente opacos para os sensitivos.

Alguns metapsíquicos, porém, acreditaram que havia verdadeira visão através de corpos verdadeiramente opacos! Tal criptoscopia neste sentido estrito, não tem base nenhuma científica. É por isto que escrevemos no título: "A mal chamada criptoscopia".

Tratando de demonstrar a visão através dos corpos opacos, por erro nas condições de experimentação fizeram-se muitas e magníficas experiências de Hiperestesia Indireta do Pensamento, isto é, de captação do pensamento de outra pessoa por meio de sinais inconscientes por ela emitidos, HIP. Nas experiências estava presente a pessoa que sabia o que havia sob o objeto opaco...

Grande fama alcançaram as magníficas experiências na Rússia com Sofia Alexandrovna. Foram dirigidas pelo Dr. Chowrin, diretor do Asilo de Alienados, de Tambow.

Com a ajuda de diversos colegas da Sociedade Médica de Tambow, o Dr. Chowrin tomou precauções, engenhosíssimas, para pôr-se a resguardo das fraudes assombrosas a que irresponsavelmente pode chegar uma histérica.

Escreveram-se cartas em caracteres tão finos que não se podiam distinguir senão com uma lupa. As cartas eram postas em envelopes, que, uma vez fechados, eram pintados com anilina preta para fazê-los mais opacos. Algumas vezes meteram-se também nos envelopes papéis fotográficos sensíveis para descobrir se por acaso os envelopes eram abertos furtivamente. Não obstante todas as precauções a doente descreveu o conteúdo das cartas em experiências repetidas umas quarenta vezes.

Os investigadores concluíram que a doente lia as cartas através dos envelopes opacizados pela anilina e através dos papéis fotográficos... Em primeiro lugar estas experiências caíram também no defeito fundamental de estarem presentes à prova as mesmas pessoas que escreveram e leram as cartas. Isto bastaria para explicar o fenômeno: HIP.

Mas nas atas das experiências temos argumentos que apoiam a explicação por Hiperestesia Indireta do Pensamento. Com efeito, não se podia supor visão através dos corpos opacos, porque Sofia Alexandrovna não olhava para os envelopes, como expressamente se afirma numa experiência que dirigiam os Drs. Troitzki e Speransk.

Outro dado muito significativo: se não sempre, ao menos freqüentemente não se "lia" o texto mesmo da carta; descreviam-se as imagens correspondentes.

Por exemplo, numa carta escrita pelo Dr. Andreoff dizia-se: "No deserto da Arábia erguem-se três palmeiras, entre as quais flui um manancial murmurante". Alexandrovna diz: "Um grande espaço. É um areal branco como a neve, mas não é neve. Três árvores muito altas, nunca vi nada semelhante. Poucas folhas, folhas compridas. Um manancial, cujo murmúrio ouve-se claramente".

"Ouve-se". É a alucinação típica provocada reflexamente pelos sinais captados inconscientemente, por HIP. Não se leu a carta: captaram-se as idéias ou imagens.

Noutra experiência tinha-se escrito: "Sofia Alexandrovna está na sua cama e olha para a parede". A doente diz sem olhar para a carta: "Enxergo uma cama, sou eu que estou na minha cama, com fitas atadas ao queixo".

Não se lia a carta por criptoscopia. Captava-se o pensamento dos assistentes: "É você tal como está na cama..."

Que não se trata de telepatia ou clarividência paranormais, extrasensoriais, é claro, entre outras razões porque não se precisaria a presença dos experimentadores ou da carta.

A explicação por HIP supõe que a doente seja hiperestésica. Era-o em grau sumo. Como temos descritos a propósito de alguns cegos, também Sofia Alexandrovna distinguia as cores pelo tato (DOP = "Dermo-Optical Perception"). Pelo tato (ou pelo olfato, etc.) distinguia também os sabores.

Os investigadores de Tambow enchiam garrafas com soluções de soda, de cloreto de sódio, de cloridrato de quinina, de sulfato de zinco... Depois umedeciam pequenos fragmentos de papel numa destas soluções.

Alexandrovna em contato com os papéis, sentia imediatamente o gosto do sal, do ácido, do adstringente ou do amargo.

Tomaram aqui a precaução de que umedecesse o papel alguém que depois não assistiria à prova com Sofia Alexandrovna. Os investigadores, pois, não sabiam qual solução era a empregada. Esta precaução não a tomaram nas experiências com cartas. Por que? Não seria porque se estava ausente o conhecedor do escrito, a experiência fracassava? Mas, diante dos papéis impregnados, a sensitiva não precisava de sinais inconscientes dos assistentes; bastava a hiperestesia direta (HD) do olfato, do gosto ou do tato sobre os objetos.

 

Caricatura. Diz que são
comunicações dos mortos... e
 - como previsto! - está captando
dos próprios vivos.

 Sendo a doente extraordinária hiperestésica, como demonstram estas últimas experiências com papéis impregnados, não será de estranhar que, por hiperestesia dos sinais inconscientes, captasse indiretamente os pensamentos dos assistentes. As experiências de Tambow, como se vê, não provam a criptoscopia, isto é, visão retiniana através dos corpos opacos (supondo que fossem verdadeiramente opacos os materiais empregados). Menos ainda provam a clarividência ou telepatia parapsicológica, extra-sensorial. São, porém, de alto valor em prol, uma vez mais, da HIP.

Dentro do âmbito da hipnose, são muitas as considerações práticas que se podem tirar do que temos exposto sobre HIP. Entre estas está, repetimos, a do perigo que podem ter sugestões só pensadas pelo hipnotizador e não manifestadas. Pacientes muito sensitivos ou treinados podem captá-las por HIP. Como aquelas sugestões não foram dadas expressamente, se o hipnotizador não as retira, em certos casos podem depois trazer complicações.

Já em 1784, Puységur descobria que com um dos seus pacientes não tinha necessidade de falar para dar as sugestões "magnéticas" (hipnóticas, diríamos hoje).

"Eu pensava, simplesmente, na sua presença e ele me compreendia e me respondia... Quando ele se mostrava disposto a dizer mais do que eu julgava prudente deixar entender, eu, só com o pensamento, interrompia imediatamente suas idéias cortando as frases no meio de uma palavra e modificava completamente seu curso".

            Por não suspeitarem da HIP, muitos investigadores tiraram conseqüências infundadas nas suas experiências com hipnotizados. Assim, por exemplo: quiseram provar a frenologia servindo-se das manifestações de pessoas submetidas à hipnose. Diziam: se estimulados uma determinada zona do crânio e o hipnotizado reage segundo o sentimento corresponde à zona frenológica excitada, isto prova evidentemente que a frenologia está certa quando diz que "Cada sentimento... tem uma sé no crânio e o estímulo destas zonas provoca o sentimento". Não poderia ser fingimento por parte do hipnotizado, porque como poderia um hipnotizado "analfabeto" saber qual o sentimento que se deve excitar nesta ou naquela zona?

            Este raciocínio, errado, vem já dos primeiros estudiosos do hipnotismo. Assim Braid acreditava demonstrar a frenologia com a seguinte observação:

            Um paciente quando se lhe estimulou a zona da cordialidade e o afeto, abraçava o médico; ao ter estimulado o órgão da combatividade no lado contrário da cabeça, com o braço correspondente golpeou dois cavalheiros que imaginou que iam agredi-lo, de tal forma que quase deixou um deles estendido no chão; enquanto isso, com o outro braço continuava a abraçar o médico da maneira mais afetuosa.

            E assim com outras zonas.

            Mas o argumento não serve: o hipnotizado pode por HIP adivinhar as idéias preferidas do experimentador e acomodar-se a elas nas manifestações.

            Ainda dentro do âmbito da hipnose. A mesma falha de argumentação têm cometido muitíssimos investigadores. Alguns experimentadores querem provar suas teorias sobre o hipnotismo baseando-se nas descrições de hipnotizados incultíssimos nas teorias hipnóticas. Outros experimentadores provam teorias diferentes, aduzindo este mesmo argumento das descrições dos hipnotizados incultos...

            No entanto, pode ser que os hipnotizados, apesar de não saberem nada de hipnose teórica, captem, por HIP as teorias preferidas do mesmo hipnotizador...

            Um dos erros mais lamentáveis e freqüentes é o daqueles que procuram provar uma regressão da idade até o óvulo fecundado e inclusive até o espermatozóide... Dizem: como poderia o hipnotizado, sendo inculto, descrever perfeitamente o espermatozóide, a evolução do óvulo, etc? O hipnotizado não o sabia, mas aí está o médico hipnotizador que o sabe, e o hipnotizado o confirma nas suas idéias mesmo que estejam tão equivocadas como essas.

            As conseqüências práticas que poderíamos tirar da HIP são numerosíssimas...

 

Pe.  Oscar G. Quevedo S.J.

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